Número total de visualizações de páginas

4.08.2011

NOT NOW DARLING, I'M READING HIM

Após ler-te e reler-te e voltar a ler-te, concluo que não me canso de ti.  Quando me sinto escurecer, agarro num dos teus livros e transformo-me em ti. Ora fico por casa ora saio em busca do nada que acabo, inevitavelmente, por encontrar. O telefone toca e é sempre a mesma voz desconhecida a oferecer-me o mistério da minha própria vida numa bandeja de prata. I don't panic. I count to ten. Then I panic! É sempre assim desde que te comecei a ler. Não consigo parar de fazê-lo. E muito menos esquecer as tuas palavras. Como posso eu esquecer-te se, és afinal, a minha infância?

BE ORIGINAL

Se nasceu como um original,
não morra uma cópia!

TEMPO DE MUDAR

"Há um tempo em que é preciso abandonar as roupas usadas, que já tem a forma do nosso corpo, e esquecer os nossos caminhos, que nos levam sempre aos mesmos lugares. É o tempo da travessia: e, se não ousarmos fazê-la, teremos ficado, para sempre, à margem de nós mesmos. " Fernando Pessoa 

ENTRE CONTINENTES

Sempre que reaparece o sol, agarro no meu livro e vou-me instalando nas esplanadas do meu bairro. Por momentos, dou por mim a olhar em volta e a observar.

A esplanada a norte tem sol pela manhã e uma população essencialmente constituída por casais e os seus rebentos mais ou menos barulhentos. Surgem sempre aos pares, acompanhados de carrinhos de bebé ou de crianças de 2, 3 anos pela mão. De vez em quando, aparece uma avó ou outra. Nada mais acontece por ali. Escolho este local apenas pelo sol. Nada tenho contra as crianças. Mas os pais aos berros, clamando pela Carolina, pelo Bruno e pelos Ricardinhos enervam-me. E ainda mais irritante é a terrível abelha-maia que desata a grunhir sempre que recebe uma moeda de 1 euro e onde aqueles seres passam uns momentos de plena felicidade, encavalitados em cima da dita abelha. Resisto. Aguento. Fumo mais um cigarro. O fumo espalha-se. Ai, o fumo!, - pensam alguns pais embora se mantenham em silêncio. Bebo mais um café.

A outra esplanada tem sol pela tarde. É habitada por uma gente diferente. Observo-os de vez em quando. Porra, são giros. E vestem-se bem. Invariavelmente, usam jeans de marca, ténis puma e t-shirt coladinha ao corpo. Perceberam? Coladinha ao corpo... Pois! São eles mesmo. Instalam-se por ali aos pares. Outras vezes sós. Transportam consigo o seu laptop com internet wireless e são uns heróis. De quando em vez atendem o seu telemóvel de terceira geração.

Sorrio. Sorrio-me. Sou uma ilha entre estes dois continentes que nunca se cruzam

SOU COMO UM GATO

"Sou como um gato. Atirem-me ao ar e cairei sempre de pé." Bette Davis

Atirou-se da janela do 5.º andar. Pela segunda vez. Apanhei-o de dentro de uma poça de sangue. Olhava-me com os seus olhos ternos e suplicantes. Amo-o. Amei-o desde a primeira vez que o vi. Pequenino, hesitante. Agarrei-o ao colo e trouxe-o comigo para casa contra todas as expectativas. Desde esse dia que me apoio nele. Um ser arisco e ternurento, de uma ternura extraordinariamente independente mas que me prende, me conforta e me dá prazer.

Levei-o às urgências. Disseram-me: "se for coluna vertebral, terá de mandar abater." Assim, nua e cruamente, como se eu pudesse mandá-lo abater e continuar na posse de todas as minhas faculdades. Mas não era. Parecia apenas. Fractura da bacia. Ficou no hospital. Regressou ontem para casa. Agora está aqui ao meu lado, imóvel e questionante, com os seus olhos suplicando mimo e festas. Safou-se desta! Mas só já lhe restam 5 vidas. Sinto-o próximo de mim. É como se, solidário comigo e com os meus momentos de atracção pelo abismo, se atirasse da varanda em meu lugar.

EM BUSCA DO CARNEIRO SELVAGEM

EM BUSCA DO CARNEIRO SELVAGEM

De novo, a viagem iniciática. A procura do que se perdeu algures. O contacto com a morte e o que daí resulta para cada protagonista de Murakami. Mais fragmentos dispersos da consciência de um "eu", dos nossos "eus", porque é difícil falar das coisas que realmente nos importam, Murakami vai intercalando na sua quest pelo sentido da existência, personagens que apresentam em comum o contacto com o mar, o refúgio em locais distantes e isolados, o nonsense do que depois se torna essência.

Em Busca do Carneiro Selvagem: tudo o que faz uma vida... acordar, trabalhar, perder, amar, sofrer, chegar, partir. Há coisas que se esquecem, outras desaparecem, outras ainda morrem. não é preciso fazer nenhum drama por isso. (p.32) Pois não. Morte, vida, sonho, sexo, amor, traição, gatos, mar, cabana, mistério, obcessão, rotinas... No aquário da minha imaginação é sempre fim de Outono, diz o protagonista. O mesmo Outono que se sentiu em Kafka Kamuri, o mesmo Outono do próprio Murakami, o nosso próprio Outono...

O carneiro selvagem que todos possuímos dentro de nós mas deixámos fugir. Ou o carneiro selvagem que todos procuramos porque toda a gente tem alguma coisa que não quer perder: Nem essas células dos nossos corpos que se renovam todos os meses e que levam consigo parte de nós. Tornamo-nos carneiros tresmalhados... Sim, que à força de vivermos rodeados de gente estúpida, acaba-se por desconfiar e tudo e de todos. Quem me dera, também eu, partir em busca de qualquer coisa. Precisamos de ir em busca de qualquer coisa, algo que dê significado à vida. É isso, a vida: uma busca permanente. (p.240)